O Dr. David Carbone, presidente da International Association for the Study of Lung Cancer (IASLC), virá ao XX Congresso Brasileiro de Oncologia Clínica, em outubro, no Rio, para discutir novas estratégias de tratamento do câncer de pulmão inicial e localmente avançado. Ele é professor de Medicina Interna, diretor do James Thoracic Center na Ohio State University (EUA) e detém a cadeira Barbara J. Bonner in Lung Research. Nesta entrevista, o palestrante internacional comenta o impacto das novas terapias no câncer de pulmão e o papel dos oncologistas nas discussões sobre custo-efetividade dos tratamentos.
A imunoterapia trouxe grandes avanços no tratamento do câncer de pulmão. A doença metastática ainda costumava ser percebida como altamente letal. Você entende que isso já mudou? Como vê o futuro do tratamento do câncer de pulmão?
O câncer de pulmão ainda é uma doença horrível e altamente letal, com a maioria dos pacientes vivendo menos de alguns anos após o diagnóstico. Mas, enquanto no passado não tínhamos ferramentas efetivas para combater essa doença, com o advento da caracterização genética de tumores, podemos dar aos pacientes uma sobrevida de vários anos, com boa qualidade de vida. Contudo, ainda não curamos esses pacientes, o que reforça a necessidade de mais pesquisas. As imunoterapias representam a mais nova ferramenta disponível para nossos pacientes, mas, novamente, ela é ativa somente em um subgrupo de pacientes, parcialmente definido por características moleculares, como a expressão de PD-L1 e a carga mutacional do tumor. Com a imunoterapia, não estamos apenas vendo boa tolerância e grandes respostas em um subgrupo de pacientes, mas também uma duração de benefício sem precedentes que, ocasionalmente, continua depois de cessada a terapia. Muito trabalho ainda precisa ser feito para selecionar melhor os pacientes para essa terapia e encontrar outros mecanismos de escape imune que possam ser modificados para tratar nossos pacientes.
Quais as linhas de pesquisa que você considera mais promissoras atualmente em câncer de pulmão?
A pesquisa científica afeta diretamente a maneira como cuidamos dos nossos pacientes e há mais perguntas sem resposta do que nunca. Na minha opinião, as áreas de pesquisa mais promissoras são aquelas direcionadas a prolongar a duração do benefício da terapia-alvo com TKI contra tumores com driver mutations, de modo a converter as respostas na cura desses pacientes. Existem muitas áreas promissoras de pesquisa necessárias para imunoterapia, especialmente a definição de melhores biomarcadores para a seleção dos pacientes, definição de novos ckeckpoints imunes e a otimização do sequenciamento, da duração e da combinação de imunoterapia com outras terapias, tanto com os tratamentos já considerados padrão quanto com os novos tratamentos.
Sobre o uso racional de terapias, o que tem sido discutido em seu meio de atuação? Quais os caminhos para discutir custo-efetividade?
Com o preço extraordinário das novas terapias, a relação custo-efetividade está se tornando mais importante na prática clínica. No entanto, também é muito difícil medir e pôr em prática esse conceito. Que valor você atribui a um mês ou a um ano de vida? Como você calcula qualidade versus quantidade? E se essa vida fosse sua ou a do seu filho? Eu sou médico e cientista, não economista ou empresário. Acredito que uma melhor ciência levará a um melhor cuidado – tratar o paciente certo com apenas a quantidade certa da terapia correta, o que reduzirá os custos para o sistema de saúde, melhorando a qualidade e o tempo de vida para nossos pacientes. A relação custo-efetividade será, portanto, o produto de uma melhor ciência, não o objeto da ciência. Além disso, espero que, à medida que as novas terapias amadureçam, a concorrência entre as empresas aumente e as patentes de alguns agentes expirem, os custos também caiam. Meu objetivo pessoal é ainda descobrir os melhores tratamentos para meus pacientes com base na melhor ciência e fazer o que posso para trazer esses tratamentos para o número máximo de pacientes ao redor do mundo.
Quais são os avanços da biópsia líquida em câncer de pulmão?
As biópsias líquidas são potencialmente um grande avanço na facilidade da análise molecular do câncer de pulmão. Ela propicia isso em áreas que não contam com tecnologias de biópsia modernas e pode ajudar a orientar a terapia em situações nas quais nenhum dado estava disponível anteriormente. No entanto, ainda é uma tecnologia em evolução e, na minha visão, deve ser utilizada com cautela. Há mais falsos-negativos e até mesmo falsos-positivos com essa tecnologia. Para mim, o melhor tratamento é possível quando a biópsia inicial tem qualidade e quantidade suficientes para fazer o diagnóstico e a melhor análise disponível a partir de um único procedimento no momento do diagnóstico. Devem ser empenhados esforços no treinamento de radiologistas intervencionistas e de pneumologistas para se obter biópsias adequadas durante a avaliação inicial, e não tentar compensar diagnósticos inadequados com um teste imperfeito. O perigo novamente é perder a oportunidade de tratar pacientes com tumores com mutações condutoras que obtenham uma biópsia líquida negativa e nunca tenham a chance de receber a terapia correta.
Como você imagina a oncologia daqui a cinco anos?
Eu imagino um progresso contínuo na melhora dos resultados dos pacientes com câncer de pulmão, uma melhor cooperação internacional nesse processo e a globalização das terapias modernas hoje disponíveis apenas em algumas regiões. Isso será pontuado por saltos quânticos, como o sucesso que tivemos com bloqueadores específicos da via PD-1. Também é empolgante que a ciência básica esteja liderando o caminho para melhorar a compreensão de por que os tumores se desenvolvem, como se comportam e de como tratá-los melhor.
O que de mais interessante pretende trazer para o XX Congresso Brasileiro de Oncologia Clínica?
Quero trazer para o congresso meu entusiasmo pelas terapias baseadas na ciência e minha empolgação em trabalhar com oncologistas inteligentes e dedicados em todo o mundo na luta contra essa doença.
Qual a principal mensagem que você gostaria de passar para os jovens oncologistas?
A oncologia é uma disciplina estressante, envolvendo cuidar de pacientes com terríveis doenças para as quais temos ferramentas imperfeitas. O sofrimento e a morte que vemos na prática cobram seu preço de todos nós. No entanto, fazer o que podemos com as ferramentas disponíveis para aliviar essa dor e o sofrimento em nossos pacientes atuais torna nosso papel importante. Fazer pesquisas para melhorar as ferramentas disponíveis para a próxima geração de pacientes dá esperança a todos nós. Eu incentivaria os jovens oncologistas a orgulhar-se de sua profissão e de sua capacidade de reduzir a dor e o sofrimento de seus pacientes, cuidar de si mesmos, de modo a evitar o entorpecimento diante dos problemas que veem todos os dias, mas sobretudo a se dedicar à colaboração com outros investigadores globais para prevenir a doença por todos os meios possíveis, aplicar o estado da arte nos tratamentos aos nossos pacientes atuais e empurrar as fronteiras da ciência para ajudar a descobrir a próxima geração de terapias.
Participe do XX Congresso Brasileiro de Oncologia Clínica!
O evento será realizado de 25 a 28 de outubro, no Hotel Windsor Oceânico, no Rio de Janeiro (RJ). A programação e a área de inscrições estão disponíveis no site www.semanaonco.com.br/oncologiaclinica. #CongressoSBOC