Dados estarrecedores foram recentemente divulgados pela Sociedade Brasileira de Mastologia (SBM) em parceria com a Rede Brasileira de Pesquisa em Mastologia. O percentual de cobertura mamográfica de 2017 nas mulheres da faixa etária entre 50 e 69 anos, atendidas pelo Sistema Único de Saúde (SUS), é o menor dos últimos cinco anos. Eram esperadas 11,5 milhões de mamografias e foram realizadas apenas 2,7 milhões, uma cobertura de 24,1%, bem abaixo dos 70% recomendados pela Organização Mundial de Saúde (OMS).
Os pesquisadores coletaram dados do Sistema de Informações Ambulatorial (SIA) do DATASUS, de acordo com os códigos de procedimento 0204030030 (Mamografia) e 0204030188 (Mamografia Bilateral para Rastreamento). O número de exames esperados foi calculado de acordo com o número de mulheres na faixa etária de 50 a 69 anos e as recomendações do Instituto Nacional de Câncer (INCA) para rastreamento bienal, considerando-se cobertura de 58,9% da população-alvo.
Segundo o levantamento, os três piores Estados foram Amapá, que realizou apenas 260 exames em vez dos 24 mil esperados, seguido do Distrito Federal, com 5 mil realizados quando eram esperados 158,7 mil, e Rondônia, cuja expectativa era de realizar 76,9 mil, mas somente 5,7 mil foram realizados.
“Essa realidade vai contra o que se espera de rastreamento mamográfico no país”, afirma o Dr. Sergio D. Simon, presidente da Sociedade Brasileira de Oncologia Clínica (SBOC). Ele explica que, em todos os países onde foi introduzido o rastreamento mamográfico populacional com cobertura de 70% da população, a queda na mortalidade por câncer de mama é de aproximadamente de 35%, entre 1987 e 2017. “Uma queda muito acentuada da mortalidade por câncer, de um terço; metade atribui-se à mamografia e a outra metade, à melhoria do tratamento sistêmico do paciente com câncer”, completa.
O estudo da SBM mostra que o governo federal investiu apenas R$ 122,8 milhões dos R$ 510,7 milhões previstos para atender ao número esperado de mulheres nessa faixa etária. Conforme lembra o Dr. Simon, em 2012 a presidente Dilma designou uma verba de R$ 4,2 bilhões específica para melhoria de mamografia e do exame de Papanicolau no Brasil com o objetivo de detectar precocemente o câncer de mama e o câncer de colo de útero, respectivamente. “É evidente que esse programa não está caminhando como deveria; pelo contrário, está regredindo. Isso é um atraso e o Ministério da Saúde deveria dar muita atenção, principalmente a áreas mais desassistidas”, defende, ao ressaltar que 50% dos municípios menores sequer têm mamógrafos. “É preciso fazer políticas inteligentes para que as mulheres se lembrem que devem fazer mamografia e tenham acesso ao exame.”
Falta de qualidade e diagnóstico tardio
Outra grave questão apontada pela SBM e pela SBOC é a baixa qualidade de exames mamográficos feitos em diversos serviços. “Muitos tumores pequenos não são diagnosticados pela má qualidade da mamografia”, afirma o Dr. Simon. “O diagnóstico tardio exige o tratamento do câncer em estágio avançado, que é caríssimo e resulta em baixos índices de cura. Uma mulher jovem que morre e deixa os filhos para o Estado cuidar representa um custo social enorme. E esse desfecho poderia ser evitado se ela recebesse tratamento mais simples, mais barato e com maior chance de cura em uma fase inicial da doença”, ressalta o especialista.
Quem deve fazer mamografia
Há informações díspares sobre quem dever fazer mamografia. A Sociedade Brasileira de Mastologia preconiza periodicidade anual a partir dos 40 anos. Já o governo, a partir dos 50 anos a cada dois anos. “Um desses padrões deve ser seguido. O ideal seria mamografia para mulheres mais jovens, uma vez que no Brasil elas representam um número muito importante dos casos de câncer de mama. Nossa tendência seria a de orientar fazer a cada ano a partir dos 40. Mulheres com histórico sugestivo de câncer familiar devem começar aos 25 anos, principalmente se tiverem diagnóstico feito por exame de sangue ou saliva de que são portadoras de mutação de BRCA1 ou BRCA2”, opina o oncologista clínico. “Esse número não é pequeno: varia entre 6% e 10% das mulheres com câncer de mama. É uma grande multidão de mulheres no Brasil que têm câncer familiar e não são rastreadas de maneira adequada. Algumas delas, inclusive, precisam de ressonância, e não de mamografia, especialmente as mais jovens”, finaliza o Dr. Sergio.