Câncer de mama triplo-negativo é relativamente raro e constitui o subtipo mais grave dos cânceres de mama. Embora diversos quimioterápicos tradicionais possam ter algum grau de atividade contra a doença metastática, o controle é pouco duradouro e a expectativa de vida das pacientes é menor que dois anos. Neste contexto bastante sombrio e sem avanços significativos nas últimas décadas, foi apresentado no Congresso da Sociedade Europeia de Oncologia (ESMO Congress 2018) o IMpassion 130, primeiro estudo de fase 3 a documentar benefício significativo de imunoterapia em câncer de mama metastático. Em face da importância do resultado, o estudo foi simultaneamente publicado na mais renomada revista científica médica, o New England Journal of Medicine. Posteriormente novos dados desse estudo (biomarcadores e sobrevida global) foram apresentados no tradicional Simpósio de Câncer de Mama de San Antonio, em dezembro, nos EUA, confirmando o benefício da imunoterapia.
O estudo IMpassion 130 randomizou mulheres com câncer de mama metastático triplo-negativo na primeira linha para receberem tratamento com nab-paclitaxel e placebo ou o mesmo nab-paclitaxel acrescido de atezolizumabe, um imunoterápico moderno. Foram planejadas análises para o grupo total das 451 pacientes de cada braço de tratamento, assim como uma análise exclusivamente para as 185 pacientes de cada braço de tratamento cujos tumores tinham a presença de PD- L1 nos linfócitos que infiltram o tumor. PD-L1 é o alvo da imunoterapia (atezolizumabe) e sua presença tem sido relacionada a maior benefício da imunoterapia em diversos tipos de câncer.
Os resultados do estudo mostraram que, avaliando a população como um todo, havia um controle mais duradouro da doença no grupo tratado com atezolizumabe associado ao nab-paclitaxel, embora a diferença na duração do controle tenha sido modesta. Já na análise das pacientes com PD-L1 positivo (cerca de 40% do total), o benefício em termos de controle da doença foi maior, com uma redução do risco de progressão de 38% (o que significou um ganho de 2,5 meses no controle da doença) em favor da utilização do atezolizumabe. O resultado mais impressionante e animador, no entanto, foi a redução de 38% no risco de morte (representando um ganho de 10 meses em termos de sobrevida global, 25 contra 15,5 meses favorecendo a imunoterapia) no grupo que recebeu atezolizumabe. A toxicidade do tratamento foi leve em ambos os grupos de tratamento (com ou sem imunoterapia).
No contexto de uma doença extremamente grave e praticamente órfã de novas opções de tratamento nas últimas décadas, em função da disponibilidade de ambas as medicações em nosso País (embora aprovadas para outros tipos de tumores) e, principalmente, em face do benefício significativo que este tratamento pode proporcionar às pacientes, a Sociedade Brasileira de Oncologia Clínica (SBOC) vê fundamentos científicos sólidos para solicitar celeridade na aprovação pelas autoridades regulatórias brasileiras da combinação de nab-paclitaxel e atezolizumabe para o tratamento de pacientes com câncer de mama triplo-negativo metastático, ainda mais agora com a aprovação desta combinação terapêutica pela agência norte-americana de medicamentos, o FDA, ocorrida no dia 08 de Março de 2019. Importante ressaltar a necessidade de assegurar o controle de qualidade na identificação das pacientes triplo-negativo, e também de garantir o acesso e o treinamento dos patologistas para a correta testagem da expressão de PD-L1, pois em tempos de medicina de precisão e de custos elevados do tratamento oncológico a correta identificação garante a medicação certa para a paciente certa.
Dr. Sergio D. Simon
Presidente da Sociedade Brasileira de Oncologia Clínica (SBOC)
Dr. Carlos H. Barrios
Membro titular da SBOC
Dr. Gilberto Amorim
Membro titular da SBOC
Dr. José Bines
Membro titular da SBOC
Dr. Max S. Mano
Membro titular da SBOC
Dr. Rafael Kaliks
Membro titular da SBOC